Aconteceu num piscar de olhos, literalmente. Um amigo surgiu com a pálpebra inchada como um boxeur finalizado por nocaute, algo que talvez lhe rendesse likes numa comunidade de atletas de fim de semana, não fosse ele –meu amigo– apenas um nerd praticante de Wii Sports.
“É terçol”, resmungou, aplicando uma compressa. Ao que retruquei, num jab com a velocidade de cinco séculos de crendices: “E isso lá funciona? Pega uma aliança, esfrega na calça e aplica quente no terçol… Mas tem que ser de ouro, tá?”. Detalhe: meu amigo mal pratica a monogamia. Imagine se teria uma aliança à mão.
Superstição envolvendo terçol é algo digno de nota, sim, vide Ingmar Bergman. Em 1960, o cético cineasta sueco dirigiu “O Olho do Diabo“, comédia baseada numa mística e proverbial ziquizira oftalmológica do capiroto.
De minha parte, não vejo qualquer paradoxo nisso. Mais do que pálpebras, o truque da aliança também aquece coraçõezinhos. Ou seja: atesto e dou fé à tia-avó benzedeira que, se não me habita, pelo menos subloca meu imaginário por pura diversão. A ponto de colecionar manias que nem são minhas.
Relampejou? Corre, cobre espelho. Morreu parente? Idem. A caminho da luz, a última coisa que o fantasma quer ver é se sua cara tá boa. Contra a chuva que trouxe o raio, o mais jovem da família tem que desenhar um Sol, com giz ou caco de telha, botando um punhado de sal no meio. Se serve aquele mesmo sal que foi derramado à mesa e jogado por cima do ombro esquerdo? Peraí, que vão fincar uma faca no tronco de uma bananeira e já te respondem.
Negócio de não passar por baixo de escada: eu, hein. Abrir guarda-chuva dentro de casa é que não pode, nem trazer concha da praia. Chinelo virado é pai morto, porta de armário aberta faz a mãe empacotar. Tem coragem de dizimar sua família inteira assim? A afilhada de crisma da vizinha de um colega de trabalho de alguém misturou manga com leite e morreu. Pior: depois ainda varreram o pé da moça e ela jamais se casou!
“Ai, que bobagem, isso é coisa de velho…”, diz a pessoa que, nas redes sociais, repassa tudo para trocentos amigos. Faz challenge de “primeira foto do ano ou 365 dias de azar”, de “última viagem ou nunca mais vai pisar num aeroporto”. Marombou, se curtiu na academia? “Se não postar não funciona!” Ou seja: compartilhe sua crendice 2.0 e hashtag #tápago o atestado de pós-jovem supersticioso digital. Até porque, estamos de olho, viu?
E um olho grego, daqueles bem analógicos, para dar sorte já na porta de entrada.
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