A Câmara dos Deputados aprovou, na noite da quarta-feira (3), o projeto de lei (PL) que bloqueia descontos em pensões e aposentadorias do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A votação foi simbólica e todos os partidos orientaram a favor. O projeto ganhou tração na esteira da Operação “Sem Desconto” que revelou um escândalo de descontos indevidos na ordem de R$ 6,3 bi desviados entre 2019 e 2024. A matéria segue para apreciação do Senado Federal.
O texto foi relatado pelo deputado Danilo Forte (União-CE) e exige que qualquer desconto de mensalidade de associações ou entidades de aposentados nos benefícios do INSS só possa ser feito se houver autorização formal comprovada por assinatura eletrônica qualificada ou biometria. Todos os descontos serão bloqueados e o bloqueio somente será revertido após a validação do beneficiário.
“Nós tivemos a preocupação de adotar medidas preventivas. Não se trata de discutir o mérito, se determinada instituição é boa ou ruim, mas de inibir e impedir que esses descontos continuem ocorrendo. Hoje eu posso dizer que a instituição A é séria e a B não é, mas amanhã essa percepção pode se inverter, especialmente no ambiente de politização em que vivemos”, argumentou o relator. “Nossa preocupação foi proteger os aposentados e impedir que essa operação continue acontecendo da forma abusiva como vinha ocorrendo”, completou Danilo Forte.
No caso da contratação de empréstimo consignado, o beneficiário deverá ser avisado sobre a contratação e poderá contestá-la pelos canais de atendimento do INSS, presenciais ou on-line. Após cada contratação de crédito consignado, o benefício será bloqueado para novas operações, com exigência de novo procedimento de desbloqueio.
Além disso, a lei veda o uso de procurações ou atendimentos por telefone para desbloqueio, exigindo que o processo seja feito pessoalmente, por canais digitais oficiais ou em terminais biométricos disponibilizados pelo INSS. O projeto também prevê busca ativa, por parte do instituto, aos lesados pelas fraudes.
Pelo texto, é determinada a devolução integral quando houver descontos não autorizados. Se houver desconto indevido, a entidade ou instituição financeira responsável deverá devolver o valor integral e atualizado no prazo de até 30 dias após a notificação da irregularidade ou decisão administrativa definitiva.
Se a devolução não ocorrer nesse prazo, o INSS assume a obrigação de ressarcir diretamente o beneficiário, garantindo que ele não fique no prejuízo. Depois, o INSS deve cobrar da entidade ou do banco o valor pago. Nos casos em que a instituição estiver em intervenção ou liquidação extrajudicial e não houver como recuperar os recursos, o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) poderá ser utilizado como último recurso para a indenização. O relator retirou do texto a previsão de criação do Fundo de Reparação Previdenciária para ressarcir os descontos indevidos.
Além disso, a lei prevê a possibilidade de aplicação de sanções civis, penais e administrativas contra os responsáveis. O texto ainda inclui os descontos indevidos em benefícios do INSS entre os crimes que permitem que a Justiça determine o bloqueio imediato do patrimônio de investigados ou acusados.
O texto também concentra no Conselho Monetário Nacional (CMN) a competência exclusiva de definir as taxas máximas de juros do crédito consignado. Atualmente, o papel é dividido entre INSS e Conselho Nacional de Previdência Social.
Ao longo da votação do texto, parlamentares da direita buscaram atribuir ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a responsabilidade pela ampliação das fraudes, enquanto deputados da esquerda afirmaram que o escândalo começou no governo de Jair Bolsonaro (PL).
Partidos à esquerda buscaram alterar o projeto para retirar do texto a competência de definição dos juros do CMN, a responsabilidade de ressarcimento dos beneficiários lesados do INSS (as siglas queriam que a responsabilidade fosse compartilhada com bancos, por exemplo, no caso do empréstimo consignado) e a previsão de amortização de operações de antecipação do benefício previdenciário. Todas as propostas de mudança do texto foram rejeitadas.
A aprovação do projeto é mais uma frente aberta no Congresso Nacional para enfrentar o esquema de fraudes em descontos indevidos do INSS. Além disso, a Comissão Mista Parlamentar de Inquérito (CPMI) do INSS investiga o escândalo. O colegiado está sob o comando da oposição após uma articulação silenciosa que conseguiu retirar dos governistas a relatoria e a presidência da comissão.