O Samsung Odyssey 3D G90XF é o novo monitor gamer 4K lançado pela Samsung no Brasil e que promete de entregar conteúdo 3D real nos seus jogos e vídeos. Porém, sem precisar daqueles óculos que a gente é obrigado a usar para assistir filmes 3D no cinema e sem os incômodos que a tecnologia de 3D sem óculos do Nintendo 3DS trazia. E eu preciso admitir: quando funciona perfeitamente, a experiência é realmente impressionante. A sensação de profundidade, os objetos claramente separados em camadas e com partículas saltando na sua frente e outros são coisas que realmente te faz querer parar e admirar o jogo de outra forma.
A Samsung conseguiu, usando um sistema de rastreamento ocular e lentes especiais na tela, criar um efeito tridimensional que é um dos melhores que eu já vi sem a necessidade de óculos. Em jogos compatíveis, a imersão ganha um nível completamente novo. Entretanto, há sempre um “mas”, e aqui a ressalva é muito grande e muito clara. A experiência vem com uma lista de limitações que deixam a sensação de que, por mais impressionante que seja jogar os games cuidadosamente adaptados para ele, a realidade é que essa aqui é uma demonstração técnica, um pouco melhor e muito mais bem construída que um protótipo, mas que ninguém deveria cogitar de verdade comprar por enquanto.
E é por isso que esse review aqui é um pouco diferente. Sim, eu vou analisar o Odyssey G90XD como um monitor gamer, mas, mais do que isso, eu vou explicar as diferenças da tecnologia dele para tudo o que veio antes. Ele é o exemplo perfeito para responder a uma pergunta que todo mundo já deve ter se feito se entrou em uma seção 3D recentemente: por que, em pleno 2025, a gente ainda não tem salas de cinema com 3D sem precisar daqueles óculos? A resposta está na tela desse aparelho da Samsung. A tecnologia que encanta neste monitor é a mesma que expõe os enormes desafios que nos separam de um futuro em que os óculos 3D sejam apenas uma peça de museu.
Contexto do 3D
Para explicar de verdade porque a capacidade do 3D sem óculos desse monitor é tão impressionante, primeiro a gente tem que entender como o 3D funciona não só nas outras tecnologias que vieram antes, mas nos nossos próprios olhos e cérebro. Até para vocês entenderem porque quando gravam a tela dele, não só o efeito 3D não fica visível, mas a imagem fica até parecendo meio esquisita, borrada, duplicada.
O que a gente chama de imagem tridimensional, na verdade, é fruto da nossa capacidade de ter noção de profundidade nas imagens que a gente vê, desde que tenhamos dois olhos e um cérebro sem condições desfavoráveis. Essa percepção 3D só é possível primeiro porque os nossos dois olhos estão separados um do outro por uma certa distância, mas voltados na mesma direção. Isso faz com que eles mostrem basicamente a mesma imagem para o nosso cérebro, mas com uma ligeira diferença de ângulo. Dá para perceber isso fácil se você esticar um dedo na frente do seu rosto e fechar só um olho, depois o inverso. Parece que o nosso dedo se mexeu, mesmo tendo ficado parado.
Com essa diferença de ângulo, o nosso cérebro precisa trabalhar para conseguir formar uma imagem só com definição, sem deixar nada duplicado, borrado ou distorcido. E nesse processo de juntar as duas imagens, ele consegue extrair também a noção de profundidade, o que torna a nossa visão do mundo 3D de verdade.
Aí, a ideia de basicamente qualquer tecnologia de imagem 3D é se aproveitar desse mecanismo todo para enganar o nosso cérebro. Quando a gente olha uma imagem em uma tela 2D comum, o efeito 3D se perde porque a imagem inteira vem de um mesmo plano, sem profundidade. Só que para recuperar essa profundidade, você precisa que cada olho enxergue a mesma imagem com aquela mesma diferença sutil que os nossos olhos têm.
No cinema, eles conseguem capturar isso usando mais de uma câmera na posição certa, ou então câmeras especiais com mais de uma lente já com a distância e angulação certas. Nos games, os modelos 3D e a renderização dos gráficos são feitos já com isso em mente. E aí o desafio que cada nova tecnologia tentou resolver é como mostrar essas duas imagens para os nossos olhos de um jeito que cada olho veja só uma delas.
Os cinemas 3D de parque de diversão da minha infância resolviam essa parte usando cores. A luz normalmente se propaga como onda eletromagnética, e cada cor de luz tem uma frequência própria. Na hora de projetar a imagem na tela, uma delas era projetada com cores mais para o azul e a outra mais para o vermelho. Quando essa luz era então refletida na direção dos nossos olhos, os óculos com uma lente azul e a outra vermelha serviam como filtro, só deixando passar a luz da cor correspondente. Assim, cada olho acabava recebendo só uma das imagens e a ilusão do 3D funcionava, por mais que as cores das imagens ficassem péssim(as.
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Já nos cinemas de hoje, a tecnologia evoluiu justamente para resolver o problema das cores. Em vez de uma imagem vermelha e outra azul, o conceito usado agora é a polarização. De forma simplificada, você pode imaginar que a luz natural é como se fosse um ponto que tem um campo magnético que se espalha em todas as direções ao seu redor. Na hora de projetar as duas imagens separadas na mesma tela, a tecnologia permite polarizar esses campos para que cada imagem tenha o campo em um ângulo diferente. De um lado, o campo é na vertical, e no outro lado é na horizontal. Aí, nos óculos, a lentes incluem um filtro que permite a passagem só da luz polarizada na vertical de um lado e na horizontal do outro.
No caso do Nintendo 3DS, o 3D sem óculos funcionava porque a tecnologia dele eliminava a necessidade desses filtros dos óculos para que cada olho receba uma imagem diferente. Isso é possível porque atrás da tela do console portátil tinha um componente chamado “barreira parallax”, que basicamente servia para determinar quais pixels seriam exibidos em cada quadro e direcionava a luz de cada um deles para cada olho de forma sequencial. Só que isso exigia que a pessoa estivesse bem centralizada na tela para funcionar, e mesmo assim só dava certo em uma distância de até 60 centímetros entre a tela e os olhos. Sem falar nas dores de cabeça e mal-estar que algumas pessoas sentiam.
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Efeito 3D no Odyssey
Com isso, a gente consegue entender quão inteligente é a tecnologia aqui no Odyssey 3D. Primeiro, ele tem duas câmeras embutidas na moldura superior única e exclusivamente para rastrear em tempo real a posição dos seus dois olhos. Assim, os algoritmos e a tecnologia da de lentes lenticulares da tela conseguem direcionar os pixels para que cada um dos seus olhos receba só a parte da imagem que precisa para gerar o efeito 3D. É por isso que o efeito 3D do Odyssey só funciona para uma pessoa por vez, então se alguém vier atrás de você, a imagem para ela vai estar só esquisita.
Só que como seus olhos são rastreados, você não precisa estar parado e centralizado. Além disso, a distância também supera os 60 centímetros do 3DS. Nos meus testes, o 3D em um jogo perfeitamente compatível continuou funcionando sem problemas mesmo quando eu estava a cerca de um metro e meio do monitor.
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A profundidade do cenário, as partículas voando no ar na sua frente, os objetos ao redor dos quais você consegue ver só movendo a cabeça, tudo isso é, sim, impressionante nos jogos que usam melhor essa tecnologia. O problema aqui é que não é todo jogo que consegue tirar proveito disso.
The First Berzeker: Khazan, desenvolvido com participação da Samsung pensando nesse monitor, é o que funciona melhor e realmente impressiona. Só quebra um pouco a ilusão quando você se mexe muito rápido, e aí a imagem leva uma fração de segundo para se ajustar e passa a mesma sensação que um daqueles tazos que mudavam a imagem dependendo do ângulo que você olha.
Tem outros 27 jogos na lista de compatíveis atualmente, incluindo alguns de peso como Black Myth: Wukong, Final Fantasy VII Remake Intergrade, Hogwarts Legacy, Lies of P e os remasters dos GTA da era do PS2. Desses, eu só consegui testar o monitor jogando F.I.S.T. e o efeito 3D continua muito bom, por mais que seja mais simples do que no Khazan. De qualquer forma, eu não sofri com dores de cabeça, enjoos ou outros efeitos negativos mesmo após sessões mais longas de jogatina. O 3D passa uma sensação diferente da de olhar para uma tela normal, mas não cheguei a sentir fadiga ocular ou mental também.
Você sabe que um jogo é compatível com o 3D do monitor se, depois de instalado, ele aparece quando você abre o aplicativo Samsung Odyssey 3D Hub, necessário para o monitor funcionar em 3D. A Samsung prevê que a lista de jogos compatíveis aumente para 60 até o fim de dezembro de 2025, mas como a gente não deve comprar nada baseado só em promessa de melhorias futuras, eu digo que 28 jogos é muito pouco considerando o investimento.
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Ah, e você ainda precisa de um computador que tenha pelo menos uma placa NVIDIA GeForce RTX 3080 ou mais recente, ou equivalente da AMD, para aguentar o tranco do jogo e do 3D ao mesmo tempo. O Galaxy Book 4 Ultra que a Samsung mandou junto para o teste tem uma 4070 e mesmo assim já estava fritando depois de alguns minutinhos de jogo 3D a ponto de que não dava pra encostar.
Outra face do problema do 3D para mim nesse monitor é o que deveria ser uma solução, que é o recurso de IA que permite converter vídeos 2D em 3D na hora que você vai assistir. Primeiro, que ele não funciona em plataformas protegidas por DRM, então pode esquecer Netflix, Amazon Prime Video, Disney+, HBO Max e outros. E mesmo no YouTube, onde reza a lenda que o conteúdo já funcionou no passado, a versão que eu testei do Odyssey 3D Hub não conseguiu converter vídeos 2D normais em 3D. O pop-up até aparecia, mas clicar ali não faz nada.
O resultado é melhor se você abrir vídeos side by side e clicar na opção correspondente, mas as opções também não são tantas assim e o efeito não chega a impressionar como nos jogos.
Design
No resto do tempo, o Odyssey 3D também funciona como um monitor gamer 2D, então bora falar sobre isso. O corpo do monitor em si é em plástico de boa qualidade e é acompanhado por um suporte em metal com ajuste de altura, inclinação e giro. É um produto premium e achei bonito na cor cinza, que é a única disponível. As molduras nas laterais da tela também são bem finas, e por mais que a de cima não seja por causa das câmeras, a de baixo pelo menos é simétrica, o que equilibra o visual.
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Ele tem uma barra LED na parte de baixo que sincroniza com as cores na tela, o que também é legal, além de dois alto-falantes estéreos embutidos com qualidade sonora boa, mas que não chegam a realmente impressionar no som espacial como o marketing da Samsung sugere. Um bom headphone ainda é melhor, especialmente se seu jogo depender do direcionamento do áudio.
E tem uma boa variedade de portas na traseira, duas das quais você vai precisar ligar no mesmo computador para usar o 3D. Uma das que você vai precisar usar para conectar o monitor é a USB-B Upstream, e a outra pode ser ou a HDMI 2.1, que é a mais recomendada, ou a DisplayPort 1.4. A Samsung inclui os três cabos, além do de energia, dentro da caixa.
Tela
Considerando o preço desse monitor, o fato do painel ser IPS e não OLED pode incomodar um pouco. Os tons de preto acabam ficando acinzentados e o tempo de resposta, por mais que seja rápido em 1ms, não é a mesma coisa que os 0.03ms dos monitores gamers de ponta. O ângulo de visão é bom, mas, sendo um monitor pensado para uma pessoa só, esse benefício só faz sentido quando o 3D estiver desligado. As cores são boas, com 99% do padrão sRGB, o que está ótimo para jogos e vídeos e até para uma edição de foto e gravações aqui e ali, só não para quem for trabalhar com colorização profissional.
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A resolução 4K é também ótima, mas eu tenho que avisar que você ganha, sim, um pouco de ruído nas imagens devido à tecnologia 3D, o que dá para perceber mesmo quando você está usando o monitor em 2D. Você acostuma e para de perceber com facilidade, mas tá lá se prestar atenção. O tamanho de 27 polegadas é o que a maioria das pessoas considera o ideal para jogar competitivamente e a taxa de atualização de 165 Hz é boa para a maioria dos jogos competitivos, só que não chega aos perto dos 330 Hz ou mais que o monitores gamer tradicionais na mesma faixa de preço conseguem oferecer.
Vale a pena?
Na loja oficial da Samsung, o Odyssey 3D G90XF sai por R$ 9.689 se você pagar à vista. Por pouco mais da metade desse valor, você consegue encontrar opções OLED que superam esse aqui em absolutamente todos os quesitos, tirando a funcionalidade 3D.
Só que quando consideramos a lista de poucos jogos com suporte ao 3D do Odyssey, os problemas na IA que converte vídeos 2D e a falta de suporte das plataformas de streaming de vídeo para aproveitar filmes que poderiam ser compatíveis, aí mesmo esse recurso tão impressionante perde boa parte do sentido. Há grandes chances de a Samsung melhorar isso no futuro, mas também pode ficar só na promessa, então o melhor é segurar a empolgação e deixar para comprar depois se for o caso (talvez até pagar menos por isso).